Cultura

Moda como forma de expressão: a relação dela com política e diversidade

Por: Lívia Baroni e Lorena Aguiar

A moda é muito mais que um símbolo de consumo e futilidade. Ela também tem conexão com questões sociais e é uma forma de expressão individual e da sociedade como um todo.

Oi leitor, tudo bem? Você já deve ter ouvido falar que a indústria da moda é uma das maiores do mundo, né? Mas será que você sabe a relação dela com questões sociais, como política e diversidade? A gente conversou com um especialista na área e um criador de conteúdo de moda para o aplicativo queridinho do momento, o Tik Tok, além de jovens que gostam bastante de se expressar por meio das roupas para entender melhor esse cenário. Vem com a gente!  

Se você curte música pop, provavelmente lembra que de 2010 a 2015 existia uma boyband britânica chamada One Direction, que foi um fenômeno mundial, tornando seus integrantes internacionalmente conhecidos. Um deles é Harry Styles, que, atualmente, usa a moda como forma de expressar sua personalidade, sem necessariamente ficar restrito a roupas masculinas. Dá uma olhadinha nesse vídeo aqui sobre o estilo do cantor.

@harryciottoHarry Styles e a moda como manifestação de uma identidade #moda #fashion #harrystyles♬ Intro – The xx

O vídeo é do Harry Ciotto, que arrasa no conteúdo sobre moda, contando tudo que a gente quer saber em até um minuto. Isso que é precisão! Desde o fim de julho de 2020, ele começou a postar no Tik Tok (@harryciotto) e já conta com 88,6 mil seguidores. Não é novidade que por meio das redes sociais é possível atingir cada vez mais pessoas, assim, democratizar o acesso ao conteúdo de moda é justamente a intenção dele. “Minha ideia é levar a moda para pessoas que talvez não tenham tempo ou dinheiro para fazer cursos extras ou que não escolheram seguir essa carreira, mas estão sempre consumindo o conteúdo”. Desde a infância Harry Ciotto tem uma relação natural com a moda e até brincava com as roupas, como se estivesse em um desfile. Hoje em dia, aos 20 anos, a vestimenta é uma forma de expressar seu humor. “Se estiver usando preto da cabeça aos pés, pode saber que não estou nos meus melhores dias. E o contrário é verídico: se uso uma roupa chamativa, que transmite algum tipo de extroversão, pode saber que estou muito animado”, explica.

Assim como  Harry,  El Hana Filipides, estudante de jornalismo de 22 anos, também utiliza a moda como uma forma de expressão, mas revela que nem sempre foi assim. Antes não entendia a moda como expressão, por tentar me enquadrar em um certo padrão que me foi imposto durante longos anos. Depois que entrei na universidade, minha vida mudou completamente. Sinto como se  tivesse renascido. Os primeiros anos foram de muito descobrimento, até  encontrar um estilo específico. A moda, para mim, está muito atrelada à aceitação quanto a minha sexualidade. Quando finalmente me senti confortável sendo quem eu sou, pude expressar isso 100% na forma como me visto”.

Luis Henrique, 23 anos, divide o tempo entre a faculdade de jornalismo e a produção de conteúdo para o Tik Tok, onde já tem mais de 5 mil seguidores e também relatou como se expressa por meio da moda. “Desde 2018 tenho utilizado a moda ao meu favor, trazendo as nuances da minha existência para que as pessoas me entendam através das roupas. Anteriormente só usava o básico, agora, conforme vou me reconhecendo como ser humano, venho trazendo a moda como expressão de sentimentos”.

El Hana, à esquerda, e Luis Henrique.

Os comportamentos de El Hana e Luis Henrique têm tudo a ver com a necessidade de mais inclusão por parte da indústria da moda. Por mais de duas décadas, o desfile mais famoso do mundo foi o Victoria’s Secret Fashion Show, realizado anualmente pela marca estadunidense de lingeries. Era incrível ver as top models mais em alta do momento naquela passarela cheia de glamour e com cantores que a gente ama né? Mas, se você analisar, não vai demorar a perceber que as meninas pareciam todas iguais: altas, magras, e, em sua maioria, brancas, o que não reflete nem um pouco a diversidade de corpos reais. 

E foi justamente pela resistência da marca em diversificar seu casting que o desfile foi cancelado no ano passado. Agora, todas as atenções estão voltadas para a Rihanna, que além de ser cantora e se destacar com sua marca de maquiagem, a Fenty Beauty, pela grande variação de tons de base (são 50 cores diferentes!), passou a desenvolver uma linha de lingeries, a Savage X Fenty. Os desfiles provam que, independentemente do tamanho do corpo ou cor da pele, a moda é para todos que querem explorar seu poder e se sentirem bem consigo mesmo. Dá uma olhadinha na diferença entre o casting do desfile da Victoria’s Secret e da Savage X Fenty.

Mas você pode estar se perguntando “por que a diversidade e a inclusão são tão importantes assim?”. Quem conta é El Hana: “Enquanto uma pessoa magra, tenho muito mais acesso a peças variadas do que uma pessoa gorda, por exemplo. A gente precisa cobrar que as marcas representem pessoas reais. O mundo já evoluiu tanto e a gente ainda continua vendo os mesmos biotipos em muitos sites e campanhas”, defende. “A roupa faz parte da nossa necessidade básica, se torna uma característica da pessoa, diz muito sobre ela. A moda está inovando cada vez mais, trazendo novos palpites, imagens e as pessoas vão se moldando através delas. Acredito que essa é a importância de ver e sentir as diferenças através das roupas que as pessoas estão usando”, completa Luis. 

A relação entre moda e visão de mundo, claro, não é nova. A moda sempre acompanhou os movimentos e as transformações sociais, transmitindo à sociedade ideias adotadas por grupos sociais por meio das roupas e acessórios que usavam. Por exemplo, no movimento hippie, forte marca dos anos 60, as roupas eram coloridas e estampadas com o símbolo da paz, de acordo com o lema “paz e amor” proposto pelo movimento. Além disso, eram roupas leves, fazendo referência à liberdade defendida pela comunidade hippie. O jornalista e professor de moda, Dario Brito, explica que a forma de expressão materializada por meio da roupa é uma questão que está na base da sociedade. “Se você observar determinadas vestimentas de rituais de tribos, o vestuário fala muito. Tribos e povos milenares com determinadas roupas ritualísticas que expressam um rito de passagem ou um estado de espírito, um comportamento… essa história está muito lá atrás, não tem nem registro”.

Moda e política se misturam?     

É claro que sim! Dario explica que isso não é novidade, pois o próprio surgimento do sistema da moda como a gente conhece atualmente aconteceu no início da Idade Moderna ligado a questões de diferenciação entre as classes. “Com a ascensão da classe burguesa, que foi conquistando dinheiro mas não tinha os títulos de nobres, eles passaram a se vestir como a classe social dita da nobreza. Quando a nobreza percebia que os burgueses estavam se vestindo de uma maneira semelhante, tentavam modificar o vestuário e, logo em seguida, era copiado novamente, o que foi gerando esse movimento cíclico da moda”. Vale ressaltar que, ao longo do tempo, também ocorreu o oposto: roupas e acessórios que se popularizaram primeiro entre as classes sociais mais baixas e, depois, foram ganhando versões de grifes mais caras. Um dos maiores exemplos foi o movimento punk, que se popularizou nas ruas de Londres, no Reino Unido, durante os anos 70 e, com o tempo, foi ganhando cada vez mais adeptos.

O tiktoker Harry Ciotto também reforça a ideia de que moda e política devem andar juntos e ainda faz a gente pensar na importância de debater o assunto. “Não consigo falar de moda sem falar dos corpos que a vestem, das mãos levantadas e dos gritos silenciados. A partir do momento em que em uma coleção [de roupas] falamos de lutas e preconceitos, levantamos discursos que antes – talvez – não estavam chegando em algumas pessoas devido às bolhas sociais. É uma forma primária de conscientização”. E, de fato, gerar essa comunicação é o primeiro passo para haver mudanças. E você, já conversou com seus amigos sobre isso?

“Sendo a moda uma forma de expressão identitária, é com ela que fazemos o primeiro contato em sociedade antes de qualquer fala.” – Harry Ciotto

Ao longo do tempo, diversos estilistas e artistas se posicionaram politicamente  nas coleções que produziram ou roupas que usaram. A gente separou aqui algumas das que mais se destacam, vem ver!

Esse posicionamento que as marcas estão fazendo sobre as suas ideologias políticas é de extrema relevância, como afirma El Hana. “Quando digo que a moda me representa, eu não posso associar à minha imagem algo que fere a minha existência e vai contra os meus princípios”. Porém, esses posicionamentos podem sair pela culatra. “O dono da  marca “Riachuelo”, ficou a favor do nosso presidente (Jair Bolsonaro), então fiquei um tempo sem consumir os produtos, e até hoje só consumo quando é realmente necessário. Enquanto pessoa  negra e LGBTQI+, não quero contribuir para um indivíduo que é contra a minha existência”, comenta Luis Henrique. 

Se você ficou curioso e quer saber mais sobre a relação entre moda e política, a maravilhosa Lelê Santhana, criadora do @portaldasmodas no Instagram e colaboradora da Elle Brasil, fez um resumão em vídeo. Vale a pena conferir!

Dificilmente quem gosta de moda nunca escutou, pelo menos uma vez na vida, alguém dizer que esse é um assunto fútil. Mas, depois de tudo isso, já deu pra perceber que essa ideia não faz nem sentido, né? A moda mostra ser muito mais do que apenas uma forma de consumo, é também um forte instrumento de resistência política e uma importante forma de expressão, tendo papel significativo no que se refere à identidade e à comunicação. “Há uma necessidade de o Brasil se enxergar no espelho, então se a moda pode contribuir para isso, que contribua de maneira honesta e autêntica”, aponta o professor Dario. Isto é, cabe a nós a responsabilidade de iniciar as mudanças que queremos ver na sociedade, então não tenham medo de serem quem são e usem a moda como acharem mais conveniente, afinal, a moda é o que fazemos dela.

Sobre o autor

Carol

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Sobre O Berro

Berro é a revista dos alunos do curso de Jornalismo da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Tem uma edição semestral, vinculada à disciplina de Redação Multimídia.

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