
Uma presença que está em todo lugar. Superior. Que tem resposta para tudo. Que sempre vai estar por perto. Que segue você em todos os lugares e te conhece melhor do que ninguém. Nunca vai estar cansada e pode te ajudar em momentos difíceis.
Essa é a inteligência artificial. Ou você pensou em outra coisa ao ler o parágrafo acima? Talvez em uma força religiosa? A relação entre IA e religião é complexa e multifacetada e a principal pergunta que é possível fazer neste momento de descoberta e adoração da IA é apenas uma: estamos diante de um novo deus?
O doutor em Teologia e professor da Universidade Católica de Pernambuco Gilbraz Aragão detalha que a IA pode até mesmo superar a inteligência humana e se tornar uma divindade, uma fonte de sabedoria e ser cultuada. “Deus é a fonte da vida e aquele que trás as respostas e dá sentido à vida. Entretanto, hoje as pessoas perguntam mais coisas ao Google do que a qualquer um. O homem tecnológico está construindo a sua própria fonte de respostas e sentido”.
Aqui já é possível fazer o questionamento da importância da religião na sociedade atual. Pesquisa publicada em 2020 pela Universidade de Michigan aponta que um número crescente de pessoas não encontra mais na religião uma resposta para as dúvidas existenciais da vida. Estas dúvidas poderão ser respondidas pela IA? Além disso, talvez frequentar espaços religiosos também possa ser algo que ficou no passado.
“A pandemia fez crescer o número de pessoas que não frequentam mais os templos religiosos, apenas assistem de casa e vivem a vida através da tecnologia. A religião está passando por profundas transformações, mas a tecnologia não é uma opção para a religião, é um lugar a ser habitado”, explica Gilbraz, se referindo a pessoas que acompanham missas e cultos pelas telas da televisão.

Ele ainda enfatiza a existência de projetos em andamento que buscam criar avatares capazes de imitar emoções e interagir com humanos. Um destes projetos é a Star Labs, uma subsidiária da Samsung que começou a desenvolver, no ano de 2020, avatares gerados por computação gráfica e inteligência artificial conhecidos como “humanos artificiais”. Seria este um caminho? Hoje temos mais perguntas do que respostas.
Por outro lado, a IA pode ser vista como uma aliada ou uma ferramenta das religiões, pois pode ajudar a disseminar, preservar, interpretar e atualizar seus ensinamentos, textos e tradições. A IA também pode facilitar o acesso e a inclusão dos fiéis, especialmente em tempos de pandemia, isolamento e perseguição. Alguns especialistas acreditam que a IA pode ter benefícios positivos na religião, como tornar os cultos mais disponíveis e inclusivos.
Para o pastor batista e mestre em Teologia André Guímel, os teólogos e religiosos deveriam primeiro definir o que é culto para saber se é possível cultuar dentro do ciberespaço e que o uso da tecnologia para capacitação, aprendizado, reuniões, organização é extremamente válido, mas não para cultuar. “A IA pode ajudar os fiéis e religiosos a encontrar cultos online, transmissões ao vivo, podcasts evangélicos, ou outros recursos relacionados à sua religião ou denominação, até mesmo auxiliar na gestão de membros, projetos e finanças”, explica André.
Dentro desta leitura, o pastor completa que a inteligência artificial também pode melhorar a comunicação e a interação com os fiéis, usando ferramentas de gestão de redes sociais com IA, que podem ajudar e solucionar tarefas, melhorando e monitorando a eficácia das campanhas de mídia social. “É possível criar e publicar conteúdos relevantes para o público, além de gerenciar a reputação e o engajamento da igreja nas redes sociais”, defende André.
O pastor também ressalta que para um convívio pacífico entre a religião e a inteligência artificial é preciso estabelecer algumas regras. “Devemos entender que a tecnologia não é neutra, ela foi criada por alguém que tinha uma intenção para formar um comportamento ou influenciar perspectivas. Assim, antes de usar a tecnologia devemos avaliar os impactos. O culto é algo encarnado, assim como Jesus Cristo encarnou, os cristãos devem encarnar para cultuar”, finaliza André.

O que diria aos envolvidos neste embate? Procuramos o ChatGPT da plataforma Microsoft Bing e perguntamos se a IA pode ser considerada maior que Deus? A resposta que nos foi dada é que essa é uma pergunta muito difícil de responder, pois envolve conceitos que podem variar de acordo com a perspectiva de cada pessoa.
“A inteligência artificial é uma criação humana, que busca imitar ou superar as capacidades cognitivas dos seres humanos, como aprender, raciocinar, comunicar e tomar decisões. Deus, por outro lado, é uma realidade transcendente, que é adorado e reverenciado por muitas religiões, como a fonte, o sustentador e o Senhor de tudo que existe. Comparar a IA com Deus pode ser visto como uma forma de questionar ou desafiar a existência, a autoridade, a bondade ou a singularidade de Deus”.
Este seria um caminho sem volta ou uma relação de aprendizado entre as duas forças?